As mulheres do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais

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As mulheres eram vistas com desconfiança até pelos próprios colegas de corporação, mas hoje ninguém imagina os Bombeiros sem elas.

No início, a desconfiança reinava. Afinal, para ser bombeiro é preciso ter um ótimo preparo físico e muita coragem. “Coisa de homem”, diziam os machistas de plantão. Entretanto, o ingresso de mulheres do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais a partir de 1993 mudou esse conceito. Em pouco tempo elas conquistaram o reconhecimento da tropa, a admiração da sociedade, e hoje ninguém mais imagina os bombeiros sem a competência e – por que não dizer – o charme feminino.

Atualmente, há 451 mulheres bombeiros em um universo de 5.600 militares e não há tarefa que elas não façam, garante o comandante-geral da tropa, coronel Sílvio Melo. “A chegada das mulheres acrescentou muito à corporação, pois elas são extremamente competentes, abnegadas, atenciosas, dedicadas e minuciosas. E ainda têm uma virtude a mais, a de fazer valer a autoridade com delicadeza e inteligência. O homem é mais rude”, destaca o oficial.

Segundo o comandante-geral, não foi uma conquista fácil, principalmente para as mulheres da primeira turma, que tiveram de provar que davam conta do recado. “Num primeiro momento, a presença delas foi questionada, porque a atividade do bombeiro demanda vigor físico; tem de entrar em rios de águas escuras, em edificações incendiadas, carregar macas em ocorrências de trânsito com vítimas. Mas ficou constatado que as mulheres são capazes de fazer isso da mesma forma que os homens”, explica Melo.

Que o diga a capitão Daniela Costa, 35, integrante da primeira turma de mulheres da tropa. “Aquele primeiro curso foi o momento de provarmos nossa capacidade. Fomos exigidas ao extremo para saber até onde poderíamos ir e definir qual seria o papel das mulheres entre os bombeiros. No início, havia uma dúvida, um desconhecimento. Mas o preconceito foi caindo por terra durante o treinamento e, no fim, éramos vistas apenas como parte da tropa. Hoje não há área dos bombeiros que seja exclusivamente masculina. Não há restrições para a mulher. Não temos limites”, diz a oficial.

Daniela reconhece que a escolha, na época, não foi fácil, mas diz que qualquer dúvida sobre a profissão desapareceu quando saiu na rua fardada – autorização que os cadetes recebem ao fim do primeiro ano de treinamento. “Foi um curso muito difícil, com muitas disciplinas e treinos.

Passamos sufoco no treinamento, ficamos semana sem dormir, fizemos muita atividade física, nossa tolerância foi testada ao extremo. Perguntei-me se era mesmo aquilo. Mas, quando vesti a farda pela primeira vez, fiquei emocionada com a expressão das pessoas. Só ouvia ‘olha, uma mulher bombeiro!’”, diz a capitã, que inicialmente pensou em sentar praça na Força Aérea.

“Desde criança eu tinha carrinhos de bombeiros, mas essa era uma possibilidade que não existia na época. É uma profissão que sempre achei bonita, das poucas em que a recompensa é imediata, você vê o resultado do trabalho na hora em que faz um salvamento”, conta a integrante do Batalhão de Operações Aéreas. “Minha filha tem o maior orgulho de falar que a mãe é bombeiro e piloto de helicóptero”, diz essa belo-horizontina, casada com um colega oficial, e mãe de Ana Paula, 10, e Rafael, 2.

De acordo com Daniela, a maior parte dos adereços é incompatível com a profissão, o que não a impede de manter a graciosidade. “Uma coisa não exclui a outra. A mulher é, por natureza, vaidosa. Usamos brincos pequenos, cabelo preso, unhas discretas, mas continuamos femininas, sempre”.

Mesma opinião tem a sargento Sílvia Amélia de Souza Paula, 36, que prestou o primeiro concurso para soldado feminino em Minas Gerais. “No trabalho, evito ser muito feminina, mas é uma coisa minha, pois acho que, quanto menos a gente se destaca na multidão, mais fácil é interagir. Mas tem espaço para a Sílvia, um brinco maior, maquiagem, cabelo arrumado. Uma coisa não interfere na outra”, comenta.

Sílvia diz, contudo, que o lugar da mulher na corporação foi conquistado aos poucos. Com indisfarçável orgulho, Sílvia explica que ser bombeiro é, antes de tudo, uma vocação. “As pessoas falavam que iríamos para a área administrativa, mas entrei sabendo que ia atuar na operação, no salvamento, onde ainda estou. Gosto do resgate, nem sinto que estou trabalhando, tenho 17 anos de profissão e ainda é algo que faço com prazer. Poder ajudar alguém é maravilhoso, e ainda me pagam por isso”, conta.

Supervisor de ensino, subcomandante da Academia de Bombeiros e militar há 18 anos, o major Anderson de Almeida, 41, estava iniciando a carreira quando as mulheres chegaram à corporação. E conta que, em 1993, até o povo via a novidade com certa desconfiança. “Realmente, no começo, quando a primeira tropa feminina foi para a rua, houve um período de adaptação. Levou talvez uns cinco anos para as mulheres da tropa se firmarem e o povo entender que elas têm as mesmas condições de ser bombeiro que o homem”, avalia Almeida.

Segundo o oficial, do ponto de vista da formação e do trabalho em si, essa dúvida sobre a capacidade feminina há muito tempo acabou. “Percebemos que as mulheres dão conta de exercer a mesma função porque passam pelo mesmo treinamento. Mas elas estão sobressaindo cada vez mais. Por terem menos vagas para concursos – a legislação limita o contingente feminino em, no máximo, 10% do efetivo –, a média delas é mais alta que a dos homens. Ou seja, elas fazem todas as atividades físicas e ainda sobressaem na parte intelectual”, diz o major.

Já a aluna do curso de formação de oficiais desde 2009, Luciana Silva Procópio, 23, acredita que a razão do sucesso das mulheres na profissão de bombeiro está na força de vontade. “O caminho é um pouco mais difícil porque nossa natureza física é um pouco aquém da masculina. Mas a mulher tem mais determinação. Na parte de capacitação física e de campo, não se vê atividade que a mulher não consiga completar”, diz a jovem, vislumbrando uma longa e promissora carreira.

E com a serenidade de quem sabe que, na rígida hierarquia militar, vai chegar a hora em que elas também estarão no comando, a veterana capitã Daniela concorda com a cadete: “Minha turma foi pioneira, era a primeira vez para tudo. Até hoje estamos conquistando espaço, mas o que ainda não fizemos foi apenas porque ainda não deu tempo de serviço”. Sim, senhora!

Fonte: Revista Encontro / Reportagem: Marcelo Fiuza / Fotos: Cláudio Cunha

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