Como evitar colisões de helicópteros contra fios elétricos

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O que não é visível aos olhos pode matar e mata mesmo

A colisão de helicópteros contra fios elétricos acontece com frequência e, muitas vezes, acaba em fatalidades.

A Equipe de Segurança de Voo para Helicópteros constatou que cerca de 16% de todos os acidentes de asa rotativa envolvem a colisão contra fios elétricos ou outros obstáculos.

Enquanto isso, um estudo da Administração Federal de Aviação (FAA) sobre acidentes de colisão contra fios elétricos ocorridos entre 1994 e 2004 constatou que 41 de 124 desses acidentes envolvendo helicópteros civis foram fatais.

Combinando os fatos, os acidentes resultaram em 65 fatalidades, 45 ferimentos graves e 42 ferimentos leves. Esses acidentes incluíram helicópteros colidindo com linhas de transmissão de alta potência, fio estático, fio de telefone e cabo ou estruturas de suporte, como por exemplo, torres.

Notavelmente, 86% dos acidentes fatais ocorreram em tempo claro com boa visibilidade. Mesmo a colisão contra fios elétricos “mais suave” é capaz de causar um estrago imenso.

O relatório da FAA constatou que, entre 1994 e 2004, os helicópteros do Exército dos EUA envolveram-se em 34 acidentes de colisão contra fios elétricos que acabaram custando $8.7 milhões de dólares ou uma média de $2.57 milhóes de dólares por acidente.

O Conselho Nacional de Segurança em Transportes (NTSB) determinou que as prováveis causas dos 124 acidentes com as aeronaves civis do estudo incluíram observação visual inadequada (38 acidentes) e falha em manter suficiente autorização em relação ao obstáculo (59 acidentes).

As outras causas (dos 27 acidentes restantes) incluíram discernimento impróprio, falha em manter uma altitude adequada, planejamento de pré-voo inadequado, falha em visualizar e evitar os fios, zumbido intencional e seleção de uma área indevida para pouso.

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O ambiente operacional dos serviços de emergência médica (HEMS) é literalmente uma teia de fios elétricos e as estatísticas apresentam um insight a mais nas várias formas que ele pode surpreender uma aeronave.

Para escrever o relatório Base para a Segurança de Voo de 2001 (Flight Safety Foundation), “Erros Humanos Citados como as Principais Causas de Acidentes com Helicópteros Comerciais de Serviços de Emergência Médica dos EUA”, examinei 87 acidentes e 56 incidentes envolvendo helicópteros comerciais  de serviços de emergência médica (EMS) entre 1987 e 2000.

No total, 15 acidentes e 12 incidentes estavam envolvidos com colisão contra fios elétricos.

Como os helicópteros EMS geralmente respondem a eventos em rodovias cercadas por obstáculos e fios elétricos, não é surpresa que a maioria das colisões contra fios elétricos com helicópteros EMS ocorre durante as fases de aproximação/pouso e decolagem/partida do voo.

As estatísticas das colisões de helicópteros contra fios elétricos representam quase igualmente eventos tanto diurnos quanto noturnos. Já que tais operações são conduzidas 24 horas por dia, 7 dias por semana, os pilotos têm um desafio extra que é tentar visualizar os fios elétricos mal marcados à noite.

Esse fato coloca em dúvida a eficácia da advertência “exercite um melhor controle ‘vendo e evitando’”.

O problema da colisão de helicópteros contra fios elétricos é global. For exemplo, o estudo do Escritório de Segurança do Transporte da Austrália, “Acidentes de Colisão Contra Fios Elétricos na Aviação em Geral: Análise de Dados entre 1994 e 2004,” constatou que 117 acidentes de colisão contra fios elétricos e 98 incidentes de colisão contra fios elétricos foram relatados nesse período.

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É um mito pensar que quanto mais experiência no cockpit se tem mais seguro você está no ambiente com fios elétricos. O relatório da FAA constatou que a idade dos pilotos de helicópteros civis envolvidos nos acidentes de colisão contra fios elétricos era de 43.5 anos em média, sendo que 78% dos acidentes envolviam pilotos entre 40 e 59 anos e com uma experiência média de voo de 3.575 horas.

E o perigo aumenta constantemente. A demanda por uma conectividade maior significa milhares de novas antenas de telecomunicação e torres de transmissão de energia elétrica junto com milhares de novos fios elétricos todo ano. Além disso, geradores eólicos e torres de avaliação meteorológica (METs) têm sido erguidos a índices recordes.

As esguias METs são quase impossíveis de serem vistas e, muitas vezes, são apoiadas por cabos de sustentação igualmente quase invisíveis. Como essas torres geralmente têm menos de 61 metros de altura, elas não são obrigadas a satisfazer as exigências de marcação de obstrução da FAA, dificultando ainda mais o ‘ver e evitar’ dos pilotos de helicóptero.

A quase invisibilidade dos fios elétricos vem de um número de fatores, e não apenas dos seus tamanhos, como: condições atmosféricas, ergonomia do cockpit, ângulo de visualização, posição do sol, ilusões visuais, habilidade de examinação do piloto e acuidade visual, carga de trabalho da cabine de voo e efeito de camuflagem da vegetação próxima, entre outros.

Mesmo a condição da aeronave, como a presença de cavidade, deteriorização advinda com o tempo, sujeira proveniente de poeira ou de colisão com insetos, afetará significativamente a habilidade do piloto de enxergar os fios elétricos.

O optometrista Warren DeHaan do Serviços de Especialistas da Visão em Aviação, em Boulder, Colorado, fez a seguinte observação “Dependendo da iluminação e do fundo, as linhas podem ficar óbvias ou invisíveis e mudar de acordo com a situação.”

Uma revisão detalhada das pertinentes cartas aeronáuticas e do reconhecimento de alto nível tem sido (e permanecerá) uma tarefa essencial antes de iniciar uma operação de baixa altitude, tal como durante um combate a incêndio ou um pouso em um local de acidente para buscar a vítima.

No entanto, nem todos fios elétricos e torres são projetados graficamente e nem todos os gráficos de aviação conseguem acompanhar a expansão dos ambientes de fios elétricos.

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Ao mesmo tempo que um reconhecimento completo de 360 graus seja considerado uma prática padrão para a avaliação de um local de pouso ou de uma área de trabalho de nível baixo, um pequeno fio elétrico pode passar despercebido em segundos.

Fios elétricos nem sempre são visíveis. As mudanças da luz do sol podem obscurecê-los. Os fios elétricos mais antigos podem ser difíceis de enxergar porque suas cores geralmente mudam com o tempo. Por exemplo, como os fios de cobre oxidam, eles ficam com uma cor esverdeada que dificulta a sua distinção entre um gramado ou árvores no fundo.

Um fio elétrico pode ser perfeitamente visível de um ângulo e invisível de outro. A localização exata de certos fios também pode mudar durante o dia devido à flutuação da temperatura do ambiente, o que pode deixar os fios mais frouxos ou tensionados. Fios frouxos também podem ser levados pelo vento.

O Dr. DeHaan acrescenta, “O piloto precisa focar os seus olhos na direção correta, ver se existe um fio elétrico, projetar o seu plano de voo e, então, definir se há chances de colisão. Depois, tomar uma decisão quanto à ação evasiva e mover os controles. Leva tempo também para a aeronave responder. Isso tudo pode levar entre 5 e 6 segundos.”

Ele complementa, “Os pilotos têm a falsa impressão de que eles visualizarão os fios elétricos durante o voo enquanto estiverem no mesmo nível dos fios, mas você não pode contar com isso.”

O estudo da FAA sobre segurança em colisões contra fios elétricos indica que a visão do piloto daquilo que está do lado de fora pode ser afetada pelo ambiente vibratório do cockpit. Por exemplo, o globo ocular e as estruturas intraoculares possuem frequências naturais no intervalo de 20- a 90-Hz. A maioria dos helicópteros tem frequências estruturais no intervalo de 20-Hz. Isto significa que o desempenho visual do piloto se deteriorará depois de uma exposição prolongada a certas vibrações.

Robert Feerst, presidente da Utilities Aviation Specialists Inc, em Crown Point, Indiana, EUA, especialista altamente reconhecido nesta área, enfatizou que os pilotos “precisam saber como o inimigo se parece,” o que inclui identificar os perigos associados aos fios elétricos.

Ele destaca que o ensino regular na área de aviação deixa de ensinas aspectos importantes.

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O estudo da FAA chama atenção para o fato de que os pilotos precisam estar expostos a técnicas de reconhecimento dos diferentes tipos de fios, incluindo cabos elétricos e de sustentação e precisam prever a sua localização.

Eles precisam identificar o sistema de rede elétrica e determinar a direção dos fios elétricos a partir da orientação  dos conectores isolantes nas diversas torres. Como a tripulação de voo prevê a presença de fios elétricos bem antes de vê-los de fato?

A observação de equipamentos, como isolantes, pode ajudar as tripulações de voo a prever os padrões dos fios elétricos. Os isolantes apontam para a direção do fio elétrico, essa informação é particularmente importante quando a linha de transmissão de alta potência se curva. Condutores frouxos em uma linha de transmissão de energia podem ser mais fáceis de serem vistos.

Porém, quando operando em um ambiente de baixa altitude, a atenção do piloto de helicóptero fica voltada para o controle da aeronave, a manipulação da navegação e comunicação e a evitação de obstáculos, e tudo isso impacta nos recursos perceptuais e sensoriais disponíveis para a detecção e evitação dos fios elétricos.

O desgaste da carga de trabalho pode ser amplamente ilustrado por uma típica missão HEMS em um local de acidente. Esses voos são geralmente liberados rapidamente e muitas vezes com pouca ou nenhuma notificação prévia e pouco tempo para o plano de voo. Muitos voos HEMS são conduzidos à noite e, às vezes, em condições climáticas precárias. A condição da área de pouso é provavelmente incerta.

Fios elétricos e torres apagadas necessitam de uma iluminação apropriada e ilusões visuais são bem prováveis. O piloto pode sentir-se pouco familiarizado com a área de pouso e o pessoal em solo pode não ter observado e se preparado adequadamente e haverá certamente vários veículos, equipes de emergência e transeuntes em solo.

Durante as operações de decolagem e pouso, o piloto deve avaliar os efeitos adversos do vento, de destroços, obstáculos e congestionamento. É uma carga de trabalho pesada.

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A propósito, estar ciente de um fio elétrico não é garantia alguma de poder evitá-lo. Segundo o “Sobrevivendo no Ambiente de Fios Elétricos”, um vídeo de treinamento copatrocinado pela FAA, pela Associação Internacional de Helicópteros (HAI) e pelo Southern California Edison, 40% dos pilotos que já colidiram com fios elétricos sabiam de sua existência. Um entrevistado astucioso comentou, “É só baixar a guarda por um momento e é isso que você recebe!”

Feerst é um defensor duro de CRM no ambiente de fios elétricos. Ele frisa que todos os tripulantes, inclusive enfermeiros de voo, deveriam estar atuando em conjunto com o piloto, como uma equipe, e ser hábeis nos procedimentos e nas comunicações a bordo.

A Southern California Edison investe 6 meses de treinamento nos seus pilotos e tripulação. A tripulação é integrada às atividades do voo e participa no planejamento e na tomada de decisão diante das condições climáticas, paradas para abastecimento, ventos, condições de iluminação, perigos conhecidos, mitigação de perigos e chamada de clareiras. Feert comenta, “Todo mundo precisa estar falando a mesma língua”.

Uma maneira certa de reduzir o risco de uma colisão contra fios elétricos é manter-se longe deles. O estudo sobre segurança da FAA recomenda que os pilotos de helicóptero evitem atravessar os mares abaixo de 229 metros sempre que possível. Várias outras organizações de segurança concordam com essa recomendação. Este conselho geralmente funciona, com exceção dos ambientes com cânion, onde os fios percorrem toda fenda na terra.

De forma semelhante, é fácil esquecer que aquelas antenas para transmissão de TV com 607 metros de altura possuem cabos de sustentação ancorados de 488 metros a 607 metros da base da estrutura.

A torre transmissora de televisão ‘KVLY-TV mast’ localizada entre Fargo e Grand Forks, em North Dakota, tem 629 metros de altura e possui uma rede extensiva de cabos de sustentação para fornecer um suporte estrutural à gigante armação espalhada por 160 acres.

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Aprender como examinar os fios elétricos de forma efetiva, o que pode e não pode ser feito e o porquê, aprender táticas de voo nas proximidades de fios e saber mais sobre a efetividade dos esquemas de marcação de obstrução de hoje em dia são apenas alguns tópicos importantes que devem ser estudados por aqueles voando em ambientes com fios elétricos.

“Sobrevivendo no Ambiente de Fios Elétricos” apresenta o argumento poderoso de que um “curso rápido” nesses tópicos é lamentavelmente insuficiente. Não há substituto para um curso e treinamento abrangente. Dê uma olhada nos currículos de treinamentos fornecidos pela Utilities Aviation Specialists  (http://www.helicoptersafety.com) para você ter uma ideia da abrangência oferecida por respeitadas organizações nesta área.

É altamente recomendável que os pilotos e as tripulações que trabalham em grande proximidade com as infraestruturas de utilidade pública passem por um treinamento de segurança formal e mais detalhado na área de colisão contra fios elétricos.

Entre as recomendações no Relatório Compêndio de agosto de 2011 da Equipe Internacional de Segurança de Voo para Helicópteros (IHST) estava a instalação de equipamentos para detectar e alertar os pilotos quanto aos fios elétricos.

Entre os principais avanços conhecidos está o Sistema de Detecção de Linhas de Transmissão de Energia Elétrica (PDS) da Safe Flight Instrumentation Corp., um dispositivo de alerta leve e relativamente simples que tivemos para testes de voos na Heli-Expo da Associação Internacional de Helicópteros em 2015.

(Consulte “Flying with Safe Flight’s PDS”.)

Também estão disponíveis outros dispositivos que usam laser ou radar para examinar as redondezas quanto à presença de obstruções. No entanto, o relatório da FAA de 2008, “Estudo da Segurança de Dispositivos de Alerta para a Presença de Fios Elétricos Instalados em Helicópteros Civis e Militares,” considerou tais sistemas comparativamente pesados (entre 35 e 60 lb.) e caros (custando mais de $100,00 dólares).

O HTAWS da Honeywell foi desenvolvido especialmente para prevenir as colisões em solo, água e obstáculos, como torres e cabos de sustentação de torres. O sistema usa GPS e um banco de dados único e em expansão constante que inclui, atualmente, mais de 120.000 obstáculos construídos pelo homem. Além disso, o seu Sistema Avançado de Alerta de Proximidade ao Solo Mark XXII, desenvolvido para helicópteros com Regras de Voo por Instrumento equipados com um rádio altímetro, inclui alertas para cabos de sustentação de torres.

O HTWAS pesa cerca de 4 lb. Ele apresenta um “Módulo de Baixa Altitude” para reduzir os alertas enquanto mantém uma visão do terreno e dos obstáculos quando a tripulação está operando em tarefas de baixo nível, tais como manutenção de fios de utilidade pública.

O HeliTAWS da Sandel Avionics também é um sistema de alerta de múltiplos perigos que avisa sobre a presença de fios elétricos, as condições do terreno e obstáculos. O sistema apresenta um recurso “WireWatch” exclusivo que fornece alertas avançados de transmissão de fios elétricos, estejam ligados ou não. O monitor de alta resolução e legível sob a luz do sol de 3.29 x 3.29-in. apresenta chamadas de altitudes descendentes do rádio altímetro, interface do sistema anticolisão de tráfego, cobertura do tráfego, informações dos obstáculos e do terreno em 3-D.

O mapa possui um alcance de 0.5 nm a 20 nm em escala completa. As linhas de transmissão são listadas como um recurso opcional necessitando de verificar com a Sandel a sua disponibilidade regional. O sistema 2.7-lb. também apresenta um módulo para eliminar os alarmes falsos.

A linha final de proteção à tripulação aérea contra as colisões com fios elétricos é fornecida pelo Sistema de Proteção contra as Colisões com Fios Elétricos (WSPS). Segundo o estudo da FAA, “Parece haver evidências convincentes apoiando a efetividade do WSPS” nas estatísticas militares.

No entanto, por motivos discutidos em outras ocasiões, muitos helicópteros civis não têm as características estruturais de design para integrar tal sistema de proteção. Como se evitar o perigo de uma colisão contra fios elétricos e evitar possíveis riscos de morte não fossem razões suficientes para o desenvolvimento e a implantação de um programa de gerenciamento de riscos abrangente e mais, o custo da interrupção de energia para os usuários e do reparo dos fios poderia ser enorme.

Simplesmente aconselhar os pilotos a evitar a colisão contra fios elétricos e manter uma observação visual melhor tem sido ineficiente na solução do problema. As capacidades sensoriais, percentuais e cognitivas atarefadas do piloto serão sempre imperfeitas no ambiente de alto risco dos fios elétricos.

Assim como em muitos outros problemas de segurança na aviação, a questão da colisão contra fios elétricos requer soluções de múltiplas camadas envolvendo treinamento, vigilância, trabalho em equipe e tecnologia avançada.


Este artigo foi publicado na edição de outubro de 2015 da revista Business & Commercial Aviation com o título de “Wire Wary”.

Fonte: Aviation Week/ Reportagem: 


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