Quem fiscaliza drone?

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EDUARDO ALEXANDRE BENI
Coronel RR Polícia Militar de São Paulo

Recentemente, devido ao incidente com um drone no aeroporto de congonhas, houve uma grande mobilização de profissionais e entusiastas desse novo mercado, pois, preocupados com a repercussão negativa, criaram a Campanha Drone Consciente.

Os profissionais dessa nova atividade de aviação civil, de forma responsável, buscam aculturar-se das normas aeronáuticas. No grupo criado pelos formadores de opinião do setor surgiram dúvidas sobre de quem seria a responsabilidade para fiscalizar drones. Alguns profissionais indicaram as Polícias Militares como uma das responsáveis. Mas porque essa “cobrança” das Forças de Segurança?

Seria mesmo atribuição das Polícias Militares a fiscalização de drones?

Foto: Sargento Batista. Agência Força Aérea.
Fiscalização realizada por agente da ANAC. Foto: Sargento Batista. Agência Força Aérea.

Não tenho a pretensão de aprofundar-me em temas jurídicos, mas organizar os fatos que podem ter gerado confusão aos profissionais dessa nova atividade.

Somente para contextualizar, a ANAC ao regulamentar o setor, inseriu as aeronaves não tripuladas como mais uma atividade de aviação civil.   

Com a publicação do RBAC-E 94, em maio de 2017, ANAC também publicou um Manual de Orientações Para Usuários de Drones.

Porém, na primeira versão desse manual (pg, 21), no item “Como será feita a fiscalização das operações?“, a ANAC publicou o seguinte: “Os órgãos de segurança pública farão a fiscalização no dia-a-dia“.

Primeiro fato: Numa primeira análise poderia um manual delegar competência, bem como gerar atribuição para a polícia realizar essa fiscalização administrativa? Havendo a fiscalização pela PM, há respaldo legal de modo a garantir que não se entenda como abuso ou desvio de poder essa ação?

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Analisado o texto, a ANAC corrigiu o manual algumas semanas depois, porém o mesmo circulou por toda a internet e mídias sociais, criando uma ideia prematura de que as polícias seriam responsáveis por essa fiscalização.

Com a correção do Manual, disponível no site da ANAC, o texto foi alterado para “Os órgãos de segurança pública farão a fiscalização nas esferas civil e penal“.

Segundo fato: O texto elaborado apresentou conceitos jurídicos diferentes, pois misturou tema de direito administrativo (fiscalização), com temas de direito civil e penal.

drone2a1Vamos fazer algumas considerações sobre esse texto:

  • as polícias não atuam na “esfera civil” e não ficou claro o que se pretendeu com essa indicação.
  • a inclusão da ação das polícias nas infrações penais foi redundante, pois já é uma atribuição constitucional e infraconstitucional delas.
  • o termo “fiscalização” refere-se a atividade de polícia administrativa desempenhada por órgão competente nos limites da lei, no caso, a ANAC, DECEA ou ANATEL.

Segundo o mesmo manual, foi conferida à ANAC a responsabilidade sobre a fiscalização. “Por parte da ANAC, a FISCALIZAÇÃO será incluída no programa de vigilância continuada e as denúncias recebidas serão apuradas na esfera administrativa de atuação da Agência, de acordo com as sanções previstas no Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA – Lei nº 7.565/86).

Sobre isso, devemos lembrar que a Lei Nº 11.182/05 que criou a ANAC, conferiu a ela a competência para fiscalizar as atividades de aviação civil e de infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária (Art. 2º, Art 8º, inc. X, XVI, XXXII, etc.).

Foto: David Majella
Fiscalização realizada por agente da ANATEL. Foto: David Majella. Agência MS.

O manual prossegue dizendo que outros órgãos também “farão a FISCALIZAÇÃO de acordo com os aspectos relacionados às suas competências, como utilização do espaço aéreo (DECEA), e de radiofrequência (ANATEL)“, todos na esfera administrativa.

Novamente, lembramos que a Lei Nº 11.182/05 que criou a ANAC, NÃO conferiu a ela a competência para fiscalizar ou regulamentar o uso do espaço aéreo. (Art. 8º, inc. XXI, § 2º e § 6º).

Então, podemos dizer que a fiscalização é um ato administrativo realizado por agente público competente para verificação do cumprimento de regras/requisitos, tais como autorizações, registros, seguro, licenças, cadastros, documentos, habilitações, etc e essa ação de fiscalizar drones é uma atribuição e responsabilidade das Agências reguladoras e não requer, por exemplo, a ação da Polícia.

A Polícia Militar, por força de lei, atua no campo administrativo nas fiscalizações de trânsito em rodovias estaduais e, nos municípios, através de convênio. A Polícia Rodoviária Federal nas fiscalizações em rodovias federais. Mas nenhuma delas atua na fiscalização sanitária, marítima, portuária, fazendária, aeronáutica, etc, porque não é atribuição legal delas.

Assim, como regra geral, as polícias vão atuar somente quando houver uma infração penal, um crime (prevenção e repressão criminal). Se um drone causar lesão corporal, causar dano ao patrimônio, causar perigo concreto à aeronave ou à navegação aérea, as polícias atuarão nos termos da lei.

Da mesma forma, a polícia agirá nos casos em que uma pessoa pilotar um drone para transportar drogas ou celulares para dentro de um presídio, ou para “monitorar” uma residência ou um estabelecimento comercial sem autorização. Mas não é atribuição da polícia fiscalizar regras de uso, emprego ou pilotagem de drones, exceto, é claro, se o piloto remoto estiver cometendo uma contravenção penal ou um crime.

Nos casos que caracterizarem, por exemplo, os crimes previstos nos artigos 261 (Expor a perigo aeronave ou a navegação aérea), 129 (lesão corporal), 163 (Dano) ou 132 (Expor a perigo a vida ou a saúde de outrem) do Código Penal, as polícias agirão.

Então, de maneira prática, havendo ações integradas e coordenadas entre os Órgãos Federais e Estaduais, as Polícias poderão agir em apoio aos Órgãos reguladores. Outra possibilidade seria a celebração de convênios entre os Órgãos Federais e os Estados, porém, ao nosso ver, trata-se de uma opção mais complexa para ser implementada, mas prevista no Art. 8º, inc. XLVIII, da Lei Nº 11.182/05:

Art. 8º Cabe à ANAC…:

XLVIII – firmar convênios de cooperação técnica e administrativa com órgãos e entidades governamentais, nacionais ou estrangeiros, tendo em vista a descentralização e fiscalização eficiente dos setores de aviação civil e infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária;

Portanto, cabe aos Órgãos reguladores a fiscalização dos drones, bem como encontrar formas eficientes de atuação integrada e que propiciem a cooperação das Forças de Segurança nessa nova atividade de aviação civil regulamentada e fiscalizada pelas Agências.

Bons voos!

Voe consciente e respeite as normas!

4 COMENTÁRIOS

  1. Assunto novo, vale o trabalho de pesquisa e a natural divergência de opiniões. Que os colegas mais experientes e que têm operado Drones, apresentem suas opiniões e enriqueçam esse tema.

    Bons voos, com boa gestão!

  2. Enganos do autor do texto…

    As regras da ANAC e DECEA são as regulamentações que permitem o enquadramento dos crimes e contravenções definidas no CPB (Código Penal) e LCP (lei de contravenções penais)

    CUJO CUMPRIMENTO E FISCALIZAÇÃO É COMPETÊNCIA DA POLÍCIA (órgãos de segurança) e de qualquer cidadão…

    A saber:

    Expor a perigo aeronave ou a navegação aérea Art 261 CPB;
    -Lesão corporal Art 129 CPB;
    -Dano Art 163 CPB;
    -Perigo para a vida ou saúde de outrem Art 132 CPB;
    -Dirigir aeronave sem estar devidamente licenciado Art 33 LCP;
    -Entregar-se na prática da aviação, a acrobacias ou a voos baixos, fora da zona em que a lei o permite, ou fazer descer a aeronave fora dos lugares destinados a esse fim Art 35 da LCP;
    -outros, como o tráfico de drogas, em que o equipamento é utilizado como meio;
    Violação da privacidade implica em reparação civil mas não é crime.

    • Prezado Lucio, desculpe-me, mas não há engano algum no texto, na verdade você confunde o leitor ao misturar conceitos de direito administrativo com direito penal.

      As regras de direito administrativo criadas nas normas do DECEA e ANAC não são de competência da policia fiscalizar, exceto no caso de haver convênio entre os órgãos. No crime a polícia sempre vai atuar.

      Repito, no crime a policia sempre vai atuar, e isso está no texto muito bem explicado, mas isso não se trata de fiscalização. Vc precisa entender as diferenças das ações de cunho administrativo e penal para pode falar com tanta certeza assim e dizer que o texto está errado.

      Atualize-se

      Eduardo Beni

      • Informação retirada do Perguntas Frequentes sobre DRONE ao DECEA.
        Em quais infrações posso incorrer, operando de forma irregular?
        O Código Brasileiro de Aeronáutica – CBA (Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986) orienta a apuração e a aplicação das sanções administrativas através de várias penalidades previstas em seu artigo 289, inclusive multa, para quando o piloto de aeronaves infringir quaisquer orientações citadas neste regulamento ou qualquer ação, cumulativa ou não, que configure descumprimento a este e aos demais regulamentos afetos ao acesso ao espaço aéreo.
        A Junta de Julgamento da Aeronáutica (JJAer), prevista no Decreto nº 7.245, de 28 de julho de 2010, tem por finalidade apurar e aplicar as penalidades e providências administrativas previstas no Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) e na legislação complementar, por condutas que configurem Infrações de Tráfego Aéreo e descumprimento das normas que regulam o Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB).
        O Regulamento da Junta de Julgamento da Aeronáutica (Portaria nº 09 – DGCEA, de 05 de novembro de 2011) delineia as particularidades, os valores de multa e as orientações inerentes ao processo administrativo supracitado.
        A apuração das infrações e aplicação das sanções administrativas, descritas e previstas ao voo RPAS, não eximem seus responsáveis daqueles atos que se constituam infração ou crime nas demais esferas do Direito Cível, Criminal e de todas as demais aplicáveis.
        Para repreender a atividade irregular, os órgãos reguladores podem se utilizar do Art. 290 do CBA, o qual preconiza que a autoridade aeronáutica poderá requisitar o auxílio da força policial para obter a detenção dos presumidos infratores ou da aeronave que ponha em perigo a segurança pública, as pessoas ou coisas, nos limites do que dispõe o CBA.
        O uso irresponsável do espaço aéreo poderá ser enquadrado, conforme o caso, nas leis abaixo especificadas:
        Decreto Lei 2.848/1940 – Código Penal
        Art. 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente.
        Art. 261 – Expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea.
        Lei 7.565 – Código Brasileiro de Aeronáutica – CBA
        Art. 289 – Na infração aos preceitos deste Código ou da legislação complementar, a autoridade aeronáutica poderá tomar as seguintes providências administrativas:
        I – multa.

        Art. 291- Toda vez que se verifique a ocorrência de infração prevista neste Código ou na legislação complementar, a autoridade aeronáutica lavrará o respectivo auto, remetendo-o à autoridade ou ao órgão competente para a apuração, julgamento ou providência administrativa cabível.
        § 1° Quando a infração constituir crime, a autoridade levará, imediatamente, o fato ao conhecimento da autoridade policial ou judicial competente
        Lei 10.406/2002 – Código Civil
        Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
        Decreto Lei 3.688/1941 – Lei das Contravenções Penais
        Art. 33 – Dirigir aeronave sem estar devidamente licenciado.
        Art. 35 – Entregar-se na prática da aviação, a acrobacias ou a voos baixos, fora da zona em que a lei o permite, ou fazer descer a aeronave fora dos lugares destinados a esse fim.

        https://www.decea.gov.br/drone/

        Lá descreve as condições legais para voo.
        Fora isso você pode estar correndo risco de crime ou contravenção.

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