Segurança de Voo – Queda de tripulante em operação com cordas em helicóptero

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JOSÉ ALEXANDER DE ALBUQUERQUE FREIXO

No dia 26 de junho de 2015, toda a comunidade da Aviação de Segurança Pública e de Defesa Civil do Brasil acompanhou as notícias sobre a queda de um tripulante da aeronave EC145 Fênix 07 , do CIOPAER-CE, em Caucaia, região metropolitana de Fortaleza.

Segundo o que foi amplamente noticiado pela imprensa em todo o Brasil, inclusive com a divulgação de um vídeo amador, um Sargento do Corpo de Bombeiros sofreu uma queda ao descer de rapel em uma operação policial, sendo que teria perdido o controle da velocidade na descida, resultando em lesões nos membros inferiores. Felizmente o Tripulante não corre risco de morte e torcemos para sua pronta recuperação.

Mas pensando em segurança operacional, o que podemos aprender com esse evento? Ou melhor, o que podemos fazer para prevenir que eventos desta natureza não ocorram outra vez?

rapel

Relembrando eventos semelhantes

Primeiramente vale lembrar que eventos deste tipo não são tão raros na nossa aviação, em uma rápida pesquisa no banco de dados de Relatórios de Prevenção do GRPAe de São Paulo, encontramos dois relatos semelhantes ocorridos em treinamentos, como segue:

RelPer N° 13/96 : “ Para conhecimento, em exercício de Rapel no dia 27Set96, o Aluno acidentou-se ao efetuar o referido exercício. Mesmo após orientação do oficial responsável, o referido Aluno estava com o estado emocional alterado, devido ao fato de ser a primeira vez que efetuava tal manobra, tal manobra deu-se ao fato, do Aluno durante a descida, não fazer uso do freio oito em momento certo, deixando-o para fazê-lo próximo ao chão, onde que o mesmo chocou-se contra o solo causando lesão nas duas pernas.” (Fonte: Divisão de Segurança de Voo – GRPAe)

Rel Per Nº26/97: “Durante treinamento de rapel com alunos do curso de salvamento em altura, um dos alunos a bordo no momento de ancorar o cabo no freio oito com a Anv no pairado. O mesmo apavorou-se, “deu um branco” vindo fazer uma azelha e prendendo no mosquetão, momento em que verifiquei o erro e passei a somar problema onde a Anv passou algum tempo no pairado ocasionando um certo stress. Nesse momento houve uma pequena elevação de altura da Anv tirando a ponta do cabo aproximadamente 2m do solo, o que não foi observado por este tripulante, devido ao ocorrido, nesse momento o aluno que estava na direita, iniciou sua decida de forma muito rápida sem observar o final do cabo, vindo a cair de uma altura de aproximadamente 2m, felizmente sem danos ou ferimentos.” (Fonte: Divisão de Segurança de Voo – GRPAe)

Resumos de Relatórios Finais

Além desse tipo de queda em descidas de rapel, outros acidentes pessoais em voo ocorreram com operadores de Segurança Pública e de Defesa Civil, tais como queda de tripulante do esqui do helicóptero, queda do Mac-Guire ocasionado pelo rompimento de cordas e queda durante operação com guincho.

Com exceção das ocorrências com guincho, que merecem um estudo específico, seguem abaixo resumos dos relatórios Finais de Investigação dos eventos de acidente pessoal em voo registrados pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA) que envolveram aeronaves de Segurança Pública e de Defesa Civil:

1. Data: 21/02/1997 – Ver Relatório Final emitido em 17/07/97

Local: Candangolândia, Brasília-DF

Aeronave: Bell412, matrícula PT-HRH

Operador: Departamento de Polícia Federal.

Histórico: A aeronave decolou de Brasília para efetuar um voo local de treinamento. A missão consistia em transportar três policiais militares, os quais desceriam por “rapel” e, posteriormente, realizariam uma passagem em “Macguire”, com velocidade de 30 kt, sobre o quartel da Polícia Florestal, localizado no bairro da Candangolândia. Durante passagem em “Macguire”, a cerca de 200 ft de altura, as três cordas se romperam, a aproximadamente 15 metros abaixo do helicóptero, quase que simultaneamente. Os três policiais caíram sobre residências, vindo a falecer no local.

2. Data: 28/06/1998 – Ver Relatório Final emitido em 09/03/2005

Local: Indaiatuba – SP

Aeronave: AS350, matrícula PP-EOE

Operador: Polícia Militar do Estado de São Paulo

Histórico: A aeronave decolou de Jardim Morada para efetuar voo local de demonstração de técnica de transporte (Mac Guire), na cidade de Indaiatuba – SP, com tripulação composta por 05 (cinco) militares. Durante a demonstração, a aeronave estava conduzindo 02 (dois) Policiais Militares pelos cabos de sustentação, os quais, num certo momento, vieram a se romper, ocasionando a queda acidental dos dois tripulantes e , consequentemente, o falecimento de ambos. O helicóptero não sofreu nenhum dano e o restante da tripulação saiu ilesa.

3. Data: 12/10/2005 – Ver Relatório Final emitido em 02/07/12.

Local: Rio de Janeiro – RJ

Aeronave: AS350, matrícula PP-EPN

Operador: Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro

Histórico: No dia 12 de outubro de 2005, durante uma demonstração do Grupamento Aéreo e Marítimo da Polícia Militar, por ocasião do dia da criança, foi iniciada uma descida de rapel por ambos os lados da aeronave. Os Policiais Militares que estavam realizando a demonstração e o que estava na posição de fiel não observaram que o cabo não estava tocando o solo. Um dos militares que estava descendo percebeu esta falha e interrompeu a descida. O outro prosseguiu até sua desconexão e houve queda de uma altura de 6,5 metros aproximadamente. A aeronave pousou normalmente e o militar acidentado fraturou a tíbia e o perônio.

4. Data: 13/01/2009 – Ver Relatório Final emitido em 23/03/12.

Local: Florianópolis – SC

Aeronave: HB350, matrícula PT-HML

Operador: Polícia Militar de Santa Catarina

Histórico: O helicóptero decolou do aeródromo Hercílio Luz, SC (SBFL), com quatro tripulantes a bordo, a fim de realizar um voo local de treinamento operacional de descida em rapel na parte gramada, próxima à cabeceira 21. Durante o procedimento de descida em rapel do tripulante da direita, às 16h00min, houve o rompimento da capa da rosca que efetuava o travamento do mosquetão ao freio oito, gerando a abertura não-intencional do mosquetão. Com isso, o rapelista ficou solto e fez uma descida descontrolada e rápida pelo cabo, vindo a chocar-se contra o terreno, resultante em lesões graves.

5. Data: 24/11/2009 – Ver Relatório Final emitido em 03/07/12.

Local:Florianópolis – SC

Aeronave: BH206, matrícula PT-YEG

Operador: Polícia Civil de Santa Catarina

Histórico: O helicóptero realizava um voo local de treinamento operacional de descida em rapel no interior da Academia de Polícia Civil (ACADEPOL), em Canasvieiras, na cidade de Florianópolis, SC, com um piloto e dois tripulantes de resgate a bordo. Durante o segundo voo de treinamento de descida em rapel do tripulante pela lateral direita do helicóptero, o piloto perdeu o controle da aeronave, colidindo bruscamente contra o terreno. Não houve quaisquer lesões, entretanto foi declarado que não havia uma ambulância presente no local de treinamento.

REFLEXÃO

Analisando as cinco ocorrências que foram investigadas no âmbito SIPAER, podemos observar que três eventos ocorreram em Treinamento e os outros dois em Demonstrações, ou seja, em nenhum destes casos havia urgência para o cumprimento da missão.

Alguns fatos são comuns à todas Organizações de Aviação de Segurança Pública e de Defesa Civil (OASP), tais como:

1. A dificuldade de Manutenção de proficiência Operacional de pilotos e tripulantes em algumas operações específicas, como o rapel;

2. Escassez de recursos ou disponibilidade de horas exclusivas para treinamentos operacionais;

3. Ausência de locais para treinamento e simulação estática de descida de rapel;

4. Utilização de equipamentos inapropriados, ou até mesmo a não utilização de EPIs;

5. Deficiente gerenciamento de risco para missões que não envolvem urgência, assumindo riscos desnecessários;

6. Não previsão de equipes médicas e/ou um plano de emergência quando da realização de treinamento com rapel;

7. Talvez o mais importante para o aprendizado organizacional: A pouca troca de informações e experiências entre os Órgãos dos diversos Estados, o que permitiria o aumento da consciência situacional e mitigação de riscos.

A investigação de um acidente aeronáutico pode demorar meses ou até anos e a publicação do Relatório Final acaba perdendo seu maior objetivo, que é o de Prevenir novos acidentes.

Pegando como exemplo o acidente da aeronave PP-EOE da Polícia Militar do Estado de São Paulo ocorrido em 28/06/1998, o Relatório Final somente foi emitido em 09/03/2005, quase sete anos após. Por isso devemos melhorar as ferramentas de divulgação e troca de informações entre os diversos operadores, em especial dos setores responsáveis pela prevenção de acidentes aeronáuticos.

Todos os Relatórios Finais mencionados estão disponíveis, consultem, conheçam, divulguem!

Bons Voos a todos!


Autor: O Maj PM Freixo é Comandante de Aeronave e Chefe da Divisão de Segurança de Voo do Grupamento de Radiopatrulha Aérea da Polícia Militar de São Paulo.


4 COMENTÁRIOS

  1. Muito boa e oportuna sua abordagem, Freixo.
    O treinamento e o gerenciamento de risco devem ser rotina na política de qualquer organização aérea, seja civil, militar ou de segurança pública.
    A internalização de procedimentos, o treinamento de fraseologia e a identificação dos riscos devem preceder as operações reais e simuladas.
    Não podemos nos escorar na falta de horas de voo para justificar o deficiente treinamento; manuais, relatórios, procedimentos, equipamentos operacionais, aeronave e criatividade são recursos de treinamento em solo para “condicionamento” de pilotos e tripulantes.
    A crise dever ser o combustível para repensarmos nossas ações.
    Bons voos!

  2. Mais uma vez vemos aqui, um motivo para cobrarmos treinamento. A falta de intimidade com os equipamentos são as principais causas de determinados tipos acidentes, TREINAR, TREINAR E TREINAR. Nossa atividade requer comprometimento, os acidentes relatados são aqueles que foram para o papel, mas quando não ficou traz do “machucou?? Não!! Ah então sem novidades” uma vez ouvi a frase “O Homem faz o que treina” treinar, e criar uma rotina de treinamento, acompanhar a evolução do aprendizado. O CMT fala “em especial dos setores responsáveis pela prevenção de acidentes aeronáuticos” eu digo “em especial dos setores responsável pelo treinamento dos OPERADORES” A PREVENÇÃO SE FAZ PRENCIPALMETE DURANTE OS TREINAMENTOS.

  3. Excelente artigo Cmt, compilação, resumo e conclusão a respeito da Segurança de Voo, relacionando os principais fatores/eventos de acidentes e incidentes, que cercam nossas operações, do tipo, operações com cordas e queda de Tripulantes Operacionais durante operações. Também busco os Relatórios Finais, para conhecer, aprender, evitar procedimentos, embasar e propor melhorias justificando o emprego de novas ferramentas e da constante evolução do Treinamento da atividade que tanto gostamos e respeitamos.

    Subten BM Cardoso – BOA/MG

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