Espírito Santo – Em poucos segundos, o silêncio é rompido pelo ronco das hélices. O helicóptero do Núcleo de Operações e Transporte Aéreo (Notaer) ganha o céu do Espírito Santo enquanto, pelo rádio, um chamado marca o início de mais uma corrida contra o tempo. De resgates em rodovias e trilhas de montanha a transporte de bebês e idosos em estado crítico, os “Harpias” transformam urgência em precisão.

Criado em 2003, após a reestruturação da aviação estadual, o Notaer sucedeu o Grupamento de Radiopatrulhamento Aéreo (GRAer), que iniciou as operações aéreas no Estado em 1992. Atualmente, o núcleo dispõe de cinco aeronaves de prontidão para atender ocorrências em todo o território capixaba.

A comandante de aeronave e chefe da assessoria do Notaer, major Elizabeth Bergamin, explica que a contagem do tempo começa assim que a demanda chega à central — seja via Samu ou outros órgãos.
“Para nós, o que importa é a distância, o tempo, as condições meteorológicas, o combustível e se a aeronave está configurada com todos os equipamentos necessários para o deslocamento”, detalha.

Base multimissão

As aeronaves ficam hangaradas no Quartel do Comando-Geral da Polícia Militar, em Maruípe, Vitória. De lá, decolam para missões variadas: operações terrestres e aquáticas, apoio às forças de segurança, voos governamentais e transporte aeromédico.

Segundo a major Elizabeth, a maior dificuldade não está no clima nem no relevo, mas sim na complexidade de cada missão.
“No Caparaó, por exemplo, tivemos de subir a 9 mil pés. Não é nossa altitude padrão, já que atuamos ao nível do mar. Por isso, o treinamento é constante”, afirma.

Cada operação passa por uma análise minuciosa: altitude, meteorologia e estado da vítima. “Temos protocolos, mas cada ocorrência é única”, enfatiza.

Pousos onde for preciso

Como emergências não têm hora nem lugar para acontecer, os pilotos precisam estar preparados para pousar em áreas improváveis: praias, campos de futebol e até rodovias.
“Há toda uma coordenação com órgãos como a Polícia Militar e guardas de trânsito. Eles interditam vias para que o tempo-resposta seja o melhor possível”, explica a comandante.

Ao longo da carreira, Elizabeth viveu momentos marcantes — da perda de uma criança ao resgate de famílias ilhadas em enchentes. Prefere, porém, guardar as histórias positivas.
“Lembro de quando conseguimos retirar uma família com um bebê do telhado, no desespero da enchente. São essas situações que carregamos”, diz.

A tragédia em Mimoso do Sul

Entre as atuações recentes que mais impactaram a equipe, está a tragédia em Mimoso do Sul, em março de 2024. As fortes chuvas deixaram milhares de desalojados e provocaram mortes.
“Trabalhei lá. A cena é muito triste. Quando você volta para casa e vê o conforto do seu lar e lembra que no segundo andar das casas havia marca de água, é devastador”, relata.

No dia 23 de março, o Notaer resgatou 33 pessoas em 10 pontos do município.

Infraestrutura para pousos

A Grande Vitória conta com seis helipontos oficiais: Rodoviária de Vitória, Hospital Estadual de Urgência e Emergência (São Lucas), Hospital Jayme Santos Neves, Hospital Meridional, Residência Oficial e a própria base do Notaer. Diferentemente de heliportos, os helipontos têm estrutura reduzida e são usados como apoio operacional.

No interior, a ausência de helipontos é compensada com campos de futebol e áreas de pouso eventuais autorizadas pela Anac.

Resgates que marcaram o Estado

• Mimoso do Sul (2024) – Chuvas intensas deixaram 13,2 mil desalojados, 100 desabrigados e 18 mortos. O Notaer atuou no resgate de crianças, idosos, adultos e até bombeiros isolados.
• Serra (2021) – Dois homens que se afogavam em Nova Almeida foram resgatados do mar. Um deles, exausto, foi içado pelo sling até a areia.
• Castelo (2025) – Um piloto belga, participante do 19º Mundial de Parapente, sofreu um acidente e foi resgatado pelo helicóptero Harpia 09, sendo levado ao Hospital São Lucas.
• Araguaya (2022) – Em meio a fortes chuvas, um helicóptero transportou uma idosa de 70 anos para que chegasse a tempo ao transplante de rim em Vila Velha.