Santa Catarina – O médico João Eugenio, do Serviço Aeromédico do Estado de Santa Catarina (SAER/PCSC), esteve na primeira aeronave a chegar no local da queda de uma criança no Cânion Fortaleza, em Cambará do Sul. Em entrevista à jornalista Viviana Fronza, no Estúdio Gaúcha,, ele detalhou o que ocorreu durante a tarde.

Bianca Bernardon Zanella, 11 anos, teve o corpo resgatado por volta das 23h da quinta-feira, cerca de 10 horas após o acidente. Ela estava a cerca de 70 metros da borda do cânion.

Equipe de suporte aeromédico da Policia Civil foi mobilizada para buscar a criança que caiu no cânion.Marco Cardoso Ribeiro / Divulgação

Como foi o acionamento e a chegada de vocês ao local da queda?

Nós somos uma equipe de suporte aeromédico embarcada em uma aeronave de multimissão da Polícia Civil de Santa Catarina, que funciona como uma UTI móvel. Há várias bases no Estado, e a mais próxima da região de Praia Grande e Cambará do Sul é a nossa. O subcomandante do Corpo de Bombeiros, ao receber a informação da queda, nos acionou porque a aeronave deles estava mais distante e ainda precisava ser equipada. Estávamos a cerca de 25 a 29 minutos do local. Fomos os primeiros a chegar, por volta das 15h. No local, havia um bombeiro civil e funcionários do parque. Era uma área de acesso extremamente difícil, com vegetação densa e nevoeiro espesso, que começa muito cedo, por volta das 15h já havia muito nevoeiro no local.

E qual foi o trabalho realizado logo após a chegada?

Fomos preparados para um resgate em altura, com a equipe completa — médico, enfermeira, operadores aerotáticos, piloto e copiloto. Inicialmente, desembarcamos parte da equipe para deixar a aeronave mais leve e montamos um ponto de atendimento, como se fosse uma UTI adaptada ao terreno. A aeronave então sobrevoou o local para tentar localizar a vítima visualmente. O cânion é muito alto e a vegetação, bastante densa, com árvores de até 30 metros, o que cria uma sombra visual e dificulta a detecção aérea. Ficamos até por volta das 17h fazendo buscas aéreas, mas sem sucesso em localizar qualquer vestígio dessa pequena no local.

Foi nesse momento que as equipes do Rio Grande do Sul também começaram a atuar?

Sim. O Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul já havia mobilizado duas aeronaves e equipes com equipamento completo para resgate em altura, tanto aéreo quanto terrestre. Então, permanecemos no local até que eles chegassem ao nosso campo visual e recuamos para abrir espaço, já que não havia condição de aproximação para três aeronaves no mesmo local.

A menina foi localizada por volta das 17h30min, com a ajuda de um drone com câmera térmica. O que aconteceu a partir disso? Como se faz a análise para chegar até ela?

Exatamente. O drone identificou uma variação de temperatura em uma área, indicando a presença de um corpo humano, provavelmente de uma criança entre oito e 12 anos. Já não havia visibilidade nenhuma para operação aérea — voamos por visual e, naquela hora, era como estar dentro de uma nuvem. Além disso, a posição em que a vítima estava era um ponto de “negativo”, ou seja, uma rocha sobrepunha o local, impedindo o acesso por rapel aéreo. O resgate por helicóptero não seria viável ali.

Mesmo assim, a resposta foi rápida, não?

Sim. Por volta das 18h, o drone já havia sinalizado o local e o material de resgate estava sendo preparado. A tecnologia foi decisiva. A equipe do Rio Grande do Sul iniciou a descida de um operador de bombeiro — geralmente não é a equipe médica que faz o primeiro contato. Ele avaliaria a situação e decidiria se a vítima seria estabilizada no local ou retirada imediatamente para ser atendida em uma área segura. O que se optou é que o resgatista iria subir com a vítima. 

E como foi feita a remoção da vítima?

O resgatista subiu com a vítima utilizando uma maca apropriada, chamada maca mamute ou maca de ribanceira. A operação foi realizada em meio a nevoeiro intenso, escuridão e temperatura abaixo de zero. A complexidade exigia um cuidado extremo para garantir a segurança de todos os envolvidos.

Se o drone tivesse localizado a menina mais cedo, haveria chance de resgate ainda com luz do dia?

Talvez sim. Com mais tempo e visibilidade, poderíamos ter tentado uma aproximação por rapel ou outro tipo de técnica. Mas é difícil garantir. Cada operação é única. Mesmo com protocolos estabelecidos, adaptamos tudo às condições do momento. O mais importante é sempre focar no bem estar da vítima. Então, seria possível tentar, mas sem garantia de que conseguiria realmente e de que o desfecho seria diferente. 

Cânion Fortaleza

Veja onde foi o acidente

Menina, de 11 anos, caiu do mirante do Cânion Fortaleza por volta das 13h de quinta-feira (10)

O Cânion Fortaleza fica a 23 quilômetros da área central de Cambará do Sul. Ele tem 7,5 quilômetros de extensão, 2 mil metros de largura e uma altitude de 1.157 metros em relação ao nível do mar.

O acidente com a menina aconteceu no principal passeio do cânion. Na Trilha do Mirante, os visitantes acessam a parte mais alta do desfiladeiro, avistam a extensão do cânion e, em dias sem nevoeiro, cidades como Torres, no litoral gaúcho, e Jacinto Machado e Sombrio, em Santa Catarina.

Além do Parque Nacional da Serra Geral, onde fica o Fortaleza, Cambará também sedia o Parque Nacional dos Aparados da Serra, conhecido pelo Cânion Itaimbezinho. Ambos foram concedidos à iniciativa privada em outubro de 2021. Desde então, a administração dos parques cabe à empresa Urbia Cânions Verdes.