Durante o ENAVSEG, o Coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Alex Mena Barreto, piloto policial com mais de 20 anos de atuação na aviação policial, apresentou a palestra “A Aviação de Segurança Pública no Brasil: Expansão, Impacto e Desafios em 2025”, trazendo uma análise profunda sobre a evolução do setor na última década e o papel decisivo da aviação no cenário de segurança pública nacional.

Com formação sólida — incluindo doutorado em Ciências Policiais, habilitações de alta complexidade e extensa experiência operacional — Mena Barreto ofereceu uma visão realista, técnica e, ao mesmo tempo, inspiradora sobre onde estamos e para onde podemos avançar.

Assista ao vídeo da palestra no final deste artigo.


A Evolução de 2014 a 2025

O palestrante iniciou sua fala relembrando o contexto histórico: em 2014, quando apresentou a primeira pesquisa nacional sobre as Organizações de Aviação de Segurança Pública (OASPs), o setor possuía estrutura limitada, poucos dados e um cenário ainda embrionário de integração entre estados.

Hoje, dez anos depois, o panorama mudou radicalmente.

Expansão das Bases Operacionais

  • De 74 bases (2014) para 118 bases operacionais em 2025 – um crescimento de 59%.
  • Estados como Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Ceará e Pará se destacam pela descentralização e ampliação da cobertura operacional.
  • Casos emblemáticos, como o do Acre, mostram uma transformação surpreendente: de apenas 1 helicóptero em 2014 para 3 aeronaves e base descentralizada em Cruzeiro do Sul.

A evolução demonstra que as Organizações de Aviação de Segurança Pública deixaram de ser estruturas isoladas e passaram a compor uma malha nacional operacional robusta, capaz de responder rapidamente a emergências em qualquer ponto do Brasil.


Frota Aérea: Uma Potência que Cresce Silenciosamente

Nas frotas, o avanço é ainda mais expressivo.

Aeronaves de Asa Fixa

  • 107 aeronaves em 2025, sendo 66 turbinas e 41 pistão.
  • Houve uma inversão em relação a 2014, quando predominavam aeronaves de pistão oriundas de apreensões.
  • Modelos como Caravan, King Air, Air Tractor e até jatos executivos Citation passaram a compor a aviação de estados como Mato Grosso, Pará e Minas Gerais.

Helicópteros

  • 216 helicópteros em 2025.
  • A linha H125 (Esquilo) continua dominando com mais de 120 unidades.
  • Crescimento das aeronaves biturbinas é marcante: EC145, H135, AW109 e outros equipamentos multimissão avançados, operando com guincho, kits aeromédicos e sistemas de visão noturna.

Total

  • De 176 aeronaves (2014) para 322 aeronaves (2025)
  • Um crescimento de 82% em uma década — sem qualquer política pública estruturada que previsse tal expansão.

A explicação, segundo Mena Barreto, não foi uma política pública estruturada, seja federal ou institucional, mas sim abnegação, esforço individual e obstinação das equipes das Organizações de Aviação de Segurança Pública, que buscaram convênios, financiamento, recursos próprios e parcerias para viabilizar o crescimento de suas unidades.


O Gargalo da Década: Pilotos, Tripulantes e Mantenedores

A evolução das aeronaves não acompanhou proporcionalmente o crescimento do número de profissionais no segmento.

Efetivo Nacional

  • 3.318 profissionais atuam na Aviação de Segurança Pública (pilotos, tripulantes, médicos, enfermeiros e técnicos).
  • Crescimento de:
    • 42% no número de pilotos
    • 31% no número de tripulantes
  • Em contraste com 82% de crescimento da frota.

O impacto é claro: “Hoje o gargalo não é mais aeronave. É gente.”

A dificuldade em formar pilotos, tripulantes, instrutores e mecânicos se tornou o principal desafio estrutural da aviação pública no Brasil para os próximos anos.


A Dimensão Econômica das OASPs

Os números apresentados impressionam:

  • R$ 1 bilhão movimentado em 2024, somando investimento + custeio.
  • 15 a 20 unidades não conseguem contabilizar seus custos — evidenciando fragilidades de gestão de indicadores financeiros em algumas estruturas estaduais.

Apesar dessa lacuna, a aviação policial hoje tem tamanho físico e econômico comparável a grandes órgãos federais e deve crescer ainda mais com novas contratações, modernizações e processos de locação de aeronaves.


Resultados Operacionais: O Que Produzimos?

Uma das reflexões mais importantes da palestra gira em torno da mensuração de resultados.

Embora dados de horas de voo estejam relativamente consolidados — chegando a 60 mil horas anuais somadas — ainda não existe uma padronização nacional para indicadores de resultados:

  • prisões com apoio aéreo,
  • salvamentos,
  • resgates,
  • buscas,
  • atendimentos aeromédicos.

Ainda assim, os números apresentados são impressionantes:

Transportes Aeromédicos e de Órgãos

  • 878 transportes de órgãos (dados consolidados).
  • Destaques nacionais:
    • COMAVE (MG) com 235 órgãos transportados;
    • SOAER (RJ) com 214 órgãos transportados;
    • Casa Militar do Paraná com 133 órgãos transportados.

A FAB inteira realizou 234 transportes no ano — número próximo ao da SOAer (RJ) com apenas duas aeronaves.

Vidas Salvas

  • 8.513 pessoas salvas em 2024 pelas Organizações de Aviação de Segurança Pública.

Segundo o palestrante: “Para nós, é mais uma hora de voo. Para eles, é uma nova chance de vida.

Casos como o da Polícia Civil de Santa Catarina, com mais de 600 vidas salvas, reforçam o protagonismo das aviações estaduais na área aeromédica.


Padronização Urgente: O Grande Desafio Técnico do Setor

Dez anos depois, um problema identificado em 2014 permanece:

  • Não existem indicadores padronizados.
  • Não existe um dicionário de dados comum entre estados.
  • Termos como “resgate”, “salvamento” e “busca” variam entre bombeiros, PMs, polícias civis e Detrans.

Para Mena Barreto, essa padronização não deve vir apenas “de cima”, mas sim de iniciativas práticas das próprias unidades: “Por que esperar alguém fazer? Por que não fazemos nós mesmos?


Uma Potência com Síndrome de Vira-Lata

O ponto alto da palestra foi a constatação: A Aviação de Segurança Pública possui mais helicópteros que as Forças Armadas brasileiras.

  • OASPs: 322 aeronaves, sendo 216 helicópteros (2025)
  • Forças Armadas: 195 helicópteros

Apesar disso, o setor ainda enfrenta resistência regulatória, dificuldades políticas e pouca visibilidade estratégica.

Segundo Mena Barreto: “Somos uma potência. Precisamos tomar posse disso.


Onde estaremos em 2035?

O palestrante encerrou com uma provocação:

  • Seremos 600 aeronaves em 2035?
  • Teremos 2 mil pilotos?
  • Haverá indicadores nacionais unificados?
  • Estaremos mais integrados e teremos uma resposta operacional ainda mais rápida a desastres como o do Rio Grande do Sul?

E relembrou uma frase de John Kennedy: “Não pergunte o que seu país pode fazer por você. Pergunte o que você pode fazer pelo seu país.


Apresentação em PDF