O Voo “Visumento”

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Reynaldo Pinto Ribeiro
Supervisor de Segurança Operacional
Safety News – LÍDER Aviação

Você sabe o que é “visumento”? É um termo jocoso utilizado quando um piloto não habilitado ou não proficiente em Voo Por Instrumentos (IFR) se arrisca a voar em Condições Meteorológicas por Instrumentos (IMC) em condições adversas. Porém é um assunto mais trágico do que engraçado.

No final de 2016 foi apresentado na mídia um acidente que causou bastante repercussão, quando uma aeronave, modelo Robinson 44, decolou de Osasco em direção a uma casa de eventos localizada na cidade de São Lourenço da Serra. Durante o deslocamento a aeronave veio a colidir contra o terreno de 2382ft de altura, a aproximadamente 24,70 milhas do local de decolagem e 2,54 milhas do local de pouso. A aeronave ficou totalmente destruída. O piloto e os três passageiros a bordo faleceram.

Um dos fatores contribuintes deste acidente foi o voo “visumento”, as imagens abaixo ilustram o momento em que o tripulante entra nesta condição.

visumento

Um trabalho realizado pela Universidade de Illinois levou 20 pilotos VFR a voar em condições IMC, em simuladores de voo especialmente programados. Todos os pilotos entraram em voos não controlados que resultaram em falhas estruturais da aeronave.

Em testes repetidos no simulador, o resultado foi o mesmo: todos os pilotos perderam o controle da aeronave. O resultado diferiu apenas no tempo necessário antes do controle ser perdido que variou de apenas 20 segundos a 480 segundos.

A desorientação espacial é o grande perigo. E pode acontecer muito mais rápido do que você pensa: apenas 178 segundos em média. A Universidade de Illinois analisou 409 acidentes deste tipo e levantou algumas hipóteses sobre o porquê ocorrem:

  1. Avaliação da Situação: Os pilotos realizam um mal diagnóstico sobre as mudanças do clima.
  2. Avaliação de Risco: Excesso de confi ança do piloto, julgando suas habilidades sufi cientes em gerenciar condições climáticas adversas. Apresentando um otimismo irrealista sobre as chances de evitar danos através do controle pessoal.
  3. Tomada de Decisão: Custo de desvio para outro aeroporto.
  4. Pressão Social: Piloto se sente pressionado quando há passageiros a bordo.

Resultado da Pesquisa:

Enquanto cerca de 20% de todos os acidentes da Aviação Geral são fatais, 80% dos VFR em acidentes com IMC são fatais. Os números mais recentes da Air Safety Foundation estão mais perto de 90%.

A explicação fisiológica para a desorientação espacial é que, normalmente estamos com os dois pés no chão, visão do que está ao nosso redor, a pressão da gravidade e os ouvidos internos proporcionando o senso de equilíbrio. As referências visuais correspondem a 80% dos olhos para o cérebro e os outros 20% se dividem com o ouvido interno e os órgãos proprioceptivos. Quando você está voando, você está operando em um ambiente não natural que pode resultar em forças diferentes.

Normalmente, é fácil orientar-se no voo VFR. Você tem referência visual a um horizonte fora da aeronave, e em voo constante, você só tem uma força de 1 g agindo sobre você. Mesmo que atinja 2g em uma curva íngreme geralmente não é um problema, desde que você possa ver um horizonte para manter a orientação.

Mas quando um piloto VFR entra na nuvem, o horizonte desaparece. De repente, 80 por cento da entrada que você precisa para orientação é perdida. Pior ainda, se sua atitude de voo muda, ou você faz qualquer manobra que resulte em forças de mais de 1 g, sua sensação de equilíbrio também mudará.

Pois ilusões espaciais e desorientação são criadas quando o fluido da orelha interna responde a aceleração, desaceleração, cabrada, picada, rolagem ou guinada. Seus ouvidos internos simplesmente não detectarão a mudança.

O que se pode fazer para evitar acidentes “visumento”:

  • Certifique-se das condições climáticas.
  • Consulte TAF e NOTAM.
  • Tenha em mente planos alternativos. Se você encontrar visibilidade diminuída, siga seu plano! Isso pode ser em fazer uma curva de 180 graus, desviar para outro aeroporto.
  • Obtenha treinamento avançado em voo por instrumentos.
  • Conheça o terreno da sua missão.

No Brasil as regras para voo por instrumento estão dispostas na ICA 100-12 Regras do Ar, nesta instrução são estabelecidos os requisitos para a realização do voo IFR e as condições para a realização. Abaixo segue um extrato da instrução, quanto as condições para que este voo seja realizado no período diurno e no período noturno.

Período diurno:

  • Os aeródromos de partida, de destino e de alternativa deverão estar homologados para operação IFR diurna;
  • Caso o aeródromo de partida não esteja homologado para operação IFR, as condições meteorológicas predominantes nesse aeródromo deverão ser iguais ou superiores aos mínimos estabelecidos para operação VFR; NOTA: Nessa situação o voo somente poderá partir em VFR.
  • As condições meteorológicas predominantes no aeródromo de partida deverão ser iguais ou superiores aos mínimos estabelecidos para operação IFR de decolagem; e
  • A aeronave deverá estar em condições de estabelecer comunicações bilaterais com os órgãos ATS que existirem nos aeródromos de partida, de destino, de alternativa e com aqueles responsáveis pelos espaços aéreos que forem sobrevoados.

Período noturno:

  • O aeródromo de partida deverá estar homologado para operação IFR noturna; caso contrário, o voo deverá ser iniciado no período diurno, atendidas as exigências para o voo IFR diurno;
  • Os aeródromos de destino e de alternativa deverão estar homologados para operação IFR noturna; caso a hora estimada de chegada ao aeródromo de destino ocorra no período diurno, bastará que esse aeródromo esteja homologado para operação IFR diurna. Idêntico critério aplicar-se-á à alternativa, se a hora estimada sobre esta (via aeródromo de destino ou ponto de desvio) ocorrer no período diurno;
  • As condições meteorológicas predominantes no aeródromo de partida deverão ser iguais ou superiores aos mínimos estabelecidos para operação IFR de decolagem;
  • A aeronave deverá estar em condições de estabelecer comunicações bilaterais com os órgãos ATS que existirem nos aeródromos de partida, de destino, de alternativa e com aqueles responsáveis pelos espaços aéreos que forem sobrevoados.

Em complemento a instrução anterior, tem-se a ICA 100-1 Requisitos Para Operação VFR ou IFR em Aeródromos, nesta instrução constam os requisitos para operações de precisão e não precisão diurna e noturna.

Outra publicação da agência reguladora que prevê limitações operacionais para voo em regras visuais é o RBAC 135, onde estipula que ninguém pode operar uma aeronave transportando passageiros, em voo VFR em rota, a menos que:

(a) as formações meteorológicas abaixo do nível de voo não obstruam mais de 50% da área de visão do piloto em comando, que seja mantida uma separação de nuvens (ou formações meteorológicas de opacidade equivalente) de 1500 m horizontalmente e 300 m (1000 pés) verticalmente e que o voo seja realizado abaixo do nível de voo 150, com velocidade indicada inferior a 380 nós; e

(b) a aeronave seja operada sob as seguintes condições:

(1) para aeronaves multimotoras, se as condições atmosféricas permitirem que, em caso de falha do motor crítico, a aeronave desça ou continue o voo dentro das condições exigidas pelo parágrafo (a) desta seção; e
(2) para aeronaves monomotoras, se as condições atmosféricas permitirem que, em caso de falha do motor, a aeronave desça para pouso (normal ou de emergência) mantendo as condições exigidas pelo parágrafo (a) desta seção.

Artigo produzido por Líder Aviação, Safety News nº 24, Setembro de 2017.
Saiba mais: Brazilian Helicopter Safety Team (BHEST)
Fontes: ICA 100-1 e ICA 100-12; RBAC 135 e CASA – Civil Aviation Safety Authority (Austrália)

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